Violência nas relações de intimidade: um estudo em casais do mesmo sexo
Abstract
A violência doméstica, particularmente associada às relações de intimidade, apresenta diversas repercussões em meio social. Apesar de corresponder a um crime descrito no Código Penal Português, têm sido inúmeras as ocorrências registadas nos últimos anos. A violência na intimidade de casais homossexuais é um tema ainda pouco explorado em termos sociais e representa um fenómeno de difícil intervenção devido ao contexto em que ocorre.
Desta forma, com a presente revisão sistemática (RS) pretendeu-se caracterizar a Violência nas Relações de Intimidade (VRI) entre casais homossexuais. Mais especificamente, procurou-se identificar a tipologia de violência mais comum entre casais homossexuais; a forma das vítimas lidarem com o crime perante a sociedade; as caraterísticas exclusivas da VRI em casais do mesmo sexo; e a reação das forças de segurança perante denúncias. Adicionalmente, procurou-se avaliar o risco de viés de todos os artigos científicos incluídos na RS.
Para tal, foi efetuada a procura e recolha de dados em artigos científicos: i) compreendidos entre 2010 e 2020; ii) sem restrições geográficas; iii) escritos em português ou inglês; iv) que representassem estudos nacionais, internacionais, transversais, qualitativos e quantitativos; v) que tivessem em consideração o impacto que a VRI tem em termos mundiais; e vi) que abordassem a VRI entre casais do mesmo sexo. Ficaram excluídos artigos de revisão, estudos longitudinais, cartas ao editor, artigos duplicados, capítulos de livros, notícias, documentos técnicos, comentários, dissertações e teses e metanálises. Aplicando-se os critérios de inclusão e exclusão referidos, a presente RS incorporou 42 artigos científicos.
Os resultados evidenciam escassez de informações relativamente à VRI entre casais do mesmo sexo. No entanto, constatou-se que a violência que mais prevalece entre casais do mesmo sexo é a praticada psicologicamente; que, maioritariamente, as vítimas de VRI desenvolvem sentimentos de vitimização; que, comparativamente aos casais heterossexuais, as fontes de tensão que motivam a prática da VRI são diferentes (e.g., homofobia internalizada); e, por fim, que as forças de segurança tanto podem reconhecer, como não reconhecer o contexto em que a VRI ocorreu. Relativamente ao risco de viés, a maioria dos artigos científicos apresenta médio risco (n=26), seguindo-se o baixo risco (n=15) e o alto risco (n=1).
A identificação e compreensão das especificidades da violência entre casais do mesmo sexo contribuem para que se possam colmatar as lacunas que ainda se fazem sentir no reconhecimento desta problemática, bem como para que se possa implementar uma melhor adequação das estratégias de intervenção.