Molecular mechanisms underlying multidrug resistance phenotype in cancer cells: targeting cellular bioenergetics and pH regulation
Resumen
Avaliar a influência do perfil de expressão proteica e da biologia do cancro nas
características das células tumorais é ainda um desafio em aberto. Um exemplo é a aquisição
do fenótipo de multirresistência a fármacos (Multidrug resistance, MDR), comummente
observado durante o tratamento do cancro, que está com frequência associado ao aumento
da atividade de bombas de efluxo como a Glicoproteína P (Pgp). No entanto, muitos outros
fatores poderão estar igualmente envolvidos neste fenótipo. As células tumorais
quimioresistentes apresentam frequentemente elevadas taxas de glicólise, mesmo na
presença de oxigénio, um fenómeno conhecido por “Efeito de Warburg” e que está envolvido
na malignidade da célula tumoral. A reversão do gradiente de pH está também associada a
esta vantagem adaptativa e à quimiorresistência, sendo responsável por uma alcalinização
citoplasmática e por uma acidificação extracelular. A compreensão das bases moleculares do
cancro envolvidas na resistência a fármacos pode ter um papel relevante na descoberta de
novas estratégias capazes de reverter este fenótipo, permitindo a aplicação de tratamentos
mais eficazes.
No presente estudo, foi avaliado o papel de mecanismos envolvidos no fenótipo MDR,
adicionais à expressão da Pgp, nomeadamente a alteração do microambiente tumoral e do
metabolismo energético, assim como a influência de reguladores de pH, nomeadamente da
ATPase vacuolar (V-ATPase), na aquisição deste fenótipo.
Para a execução destes objectivos, utilizaram-se como modelos de estudo duas linhas
celulares de cancro de mama, MCF-7 e MDA-MB-231, e uma linha celular de adenocarcinoma
do intestino, HCT-15. As três linhas celulares foram expostas a dois fármacos convencionais
utilizados commumente em regimes de quimioterapia, nomeadamente o paclitaxel, agente
antimitótico e a doxorrubicina, agente alquilante. Os resultados obtidos mostraram que a linha
celular MCF-7 apresentou maior sensibilidade quando exposta a ambos os compostos, com um
IC50 inferior comparativamente às linhas HCT-15 e MDA-MB-231. Esta diferente sensibilidade
poderá estar correlacionada com os níveis de expressão das proteinas Pgp e V-ATPase nas
linhas celulares em estudo. As linhas celulares MDA-MB-231 e HCT-15 apresentam maior expressão da V-ATPase, enquanto a Pgp apenas se encontra expressa na linha tumoral HCT-15,
mais resistente. A regulação do gradiente de pH é crucial para a agressividade apresentada
pelo tumor, nomeadamente na capacidade de migração e na aquisição de multirresistência a
fármacos. Assim, foi avaliado neste trabalho o papel da acidificação extracelular nestes
parâmetros. Os resultados demonstraram que uma acidificação do pH extracelular conduziu ao
aumento da capacidade migratória e da resistência das células tumorais aos fármacos em
estudo (paclitaxel e doxorrubicina), principalmente na linha celular MCF-7. Adicionalmente, a
inibição do regulador de pH V-ATPase (pela concanamina A) na linha celular MDA-MB-231,
levou a um aumento na sensibilidade das células a ambos os fármacos e a uma diminuição
acentuada da capacidade migratória. Estes resultados demonstram a importância da regulação
do pH na aquisição de um fenótipo tumoral mais agressivo.
Paralelamente ao estudo da influência do pH extracelular, o papel da alteração
metabólica das células tumorais no fenótipo MDR foi também avaliado. Para tal, as três linhas
celulares tumorais foram tratadas com os seguintes moduladores metabólicos: iodoacetato, 2-
desoxiglucose, dicloroacetato e carbonil cianeto m-clorofenil hidrazona, atuando em
diferentes alvos energéticos das células tumorais. O efeito destes compostos no perfil
metabólico das células foi avaliado, nomeadamente pela medição do conteúdo de ATP celular
e do lactato extracelular, assim como na citotoxicidade ao paclitaxel e à doxorubicina. De
facto, a utilização destes moduladores, atuando nas principais vias energéticas das células
tumorais, levaram a uma elevada depleção de ATP e a uma alteração na produção de lactato
na maioria dos casos, acopladas a uma diminuição da resistência aos agentes antitumorais.
Esta depleção de ATP poderá levar à inativação de bombas dependentes de ATP envolvidas no
fenótipo MDR, nomeadamente a Pgp e a V-ATPase estudadas neste trabalho.
Na sua globalidade, os resultados obtidos no decorrer deste trabalho sugerem que a
utilização de compostos que tenham como alvo o metabolismo energético das células
tumorais, ou modificadores do pH característico do microambiente tumoral, poderão ser
utilizados com sucesso como co-adjuvantes na quimioterapia convencional.