Avaliação da atividade antitumoral do 3-bromopiruvato. Papel dos transportadores de monocarboxilatos (MCTs) no seu mecanismo de ação
Abstract
Os tumores malignos são caracterizados por, muitas das vezes, apresentarem o
“efeito de Warburg”, que consiste na elevada atividade glicolítica com produção de
lactato, mesmo na presença de oxigénio. Os transportadores de monocarboxilatos
(MCTs), são responsáveis por mediarem o efluxo de lactato, produzido em grande
quantidade pelas células tumorais, através da membrana plasmática. O 3-
bromopiruvato (3-BP), um halo-derivado do piruvato e análogo do lactato, é um
agente alquilante inibidor do metabolismo energético, que tem vindo a demonstrar
elevada eficácia antitumoral em estudos quer in vitro quer in vivo [1, 2]. No presente
trabalho de tese, teve-se como objetivo determinar o efeito do 3-BP em três linhas
celulares de cancro de mama (ZR-75-1 RE+, MCF-7 RE+e SK-BR-3 RE-) e avaliar o
papel dos MCTs no seu efeito citotóxico. As três linhas celulares em estudo
apresentaram diferentes sensibilidades para o 3-BP: ZR-75-1 > MCF-7 > SK-BR-3.
Nestas linhas celulares, o 3-BP reduziu a produção de lactato, induziu alterações na
morfologia da célula e aumentou a apoptose. O efeito do 3-BP parece ser citotóxico e
não citostático e irreversível, uma vez que ocorreu uma diminuição da viabilidade
celular, mesmo após a remoção de 3-BP e incubação em novo meio. Foi avaliada a
expressão de diversas proteínas, possivelmente envolvidas na ação do 3-BP,
nomeadamente hexocinase II – HK II (enzima alvo do 3-BP), MCT1, MCT2, MCT4
(possíveis mecanismos de entrada do 3-BP), CD147 (proteína chaperona do MCT1 e
MCT4) e glicoproteína P - Pgp (envolvida na resistência a múltiplos fármacos).
Relativamente à Pgp e HK II, não foi observada correlação entre a sua expressão e a
sensibilidade das linhas ao 3-BP. No entanto, a linha ZR-75-1, mais sensível ao 3-BP,
apresentou uma maior expressão das proteínas CD147 e MCT4, ao passo que a linha
mais resistente SK-BR-3 apresentou uma menor expressão de MCT1 na membrana
plasmática. Quanto ao MCT2, não foi detetada a sua expressão em nenhuma das
linhas em estudo. O tratamento das células com 3-BP não levou a alterações
significativas da expressão das proteínas em estudo.
Sendo o 3-BP um derivado de ácidos carboxílicos, foi também estudada a ação de
ácidos carboxílicos substratos dos MCTs, na sua citotoxicidade. Verificou-se que a
pré-incubação com butirato, mas não com lactato, piruvato ou acetato, aumentou
significativamente a citotoxidade provocada pelo 3-BP, especialmente na linha celular mais resistente, SK-BR-3. Adicionalmente, verificou-se nesta linha celular
que o pré-tratamento com butirato induziu o direcionamento do MCT1 para a
membrana plasmática e levou a um aumento da expressão global do MCT4 e da sua
proteína chaperona CD147. Por outro lado, o tratamento com lactato não levou a
qualquer tipo de alteração na expressão destas proteínas nas condições estudadas.
Paralelamente, foi efetuado um ensaio em que se procedeu à incubação das linhas
celulares com 3-BP e ácidos carboxílicos (butirato ou lactato), mas em simultâneo.
Assim, enquanto este tratamento com butirato e 3-BP levou a uma diminuição da
citotoxicidade deste último, o lactato não conduziu a qualquer tipo de alteração. A
expressão de MCT 1 e 4, e particularmente de CD147, diminuiu em células tratadas
com butirato e 3-BP relativamente às células tratadas apenas com butirato,
atingindo níveis semelhantes ou ligeiramente inferiores aos da expressão basal. Nas
células tratadas com lactato e 3-BP não foi observada esta alteração.
Assim, na sua globalidade os resultados indicam que os MCTs deverão estar
envolvidos na ação do 3-BP, possivelmente mediando a sua entrada para célula. O
pré-tratamento com butirato, mas não o tratamento em simultâneo, potencia o efeito
do 3-BP, provavelmente aumentando as taxas de transporte do 3-BP através de
MCT1 / 4. Este estudo aponta para o potencial uso do butirato como coadjuvante do
3-BP, quando o tratamento é realizado previamente, nomeadamente em células de
cancro de mama resistentes à ação do 3-BP e particularmente em células também
resistentes à hormonoterapia, ou seja, RE-.
Relativamente ao efeito do 3-BP em células não tumorais, verificou-se que a linha de
fibroblastos CCD-1090Sk apresentava uma elevada resistência ao composto, ao
contrário do que aconteceu com a linha de mioblastos L6 de rato. Estes estudos
precisam de ser aprofundados a fim de verificar a influência que os MCTs
apresentam no efeito do 3-BP, não só em células tumorais, como também em células
saudáveis.