Qualidade de vida em pacientes com tumores cerebrais primários. Relações com variáveis sócio-demográficas, clínicas, psicológicas e neurocognitivas
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2011Author
Braga, Elisabete Cristina da Silva Andrade de Sá
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Qualidade de Vida (QdV) é um conceito muito subjectivo e abstracto, pois é
percepcionada e vivenciada pelos indivíduos de forma diferente. Facilmente se
percebe que quando se fala em QdV não se refere apenas a ausência de uma
doença, esta é mais abrangente do que apenas a saúde física e psicológica,
englobando muitos outros factores que devem ser considerados na sua avaliação,
nomeadamente, os sentimentos e os comportamentos relacionados com as
actividades diárias.
Os tumores cerebrais acarretam um grande impacto na vida dos pacientes e podem
ser uma fonte significativa de incapacidade, visto que têm fortes implicações ao
nível de várias vertentes da vivência humana, nomeadamente ao nível da condição
física do sujeito, da sua capacidade cognitiva, da sua vertente psicológica, social e
económica, conduzindo a um declínio ao nível da sua QdV. Com o aumento da
prevalência do cancro e o desenvolvimento tecnológico e terapêutico na área da
saúde, verificou-se um aumento da esperança de vida destes pacientes, levando a
que a oncologia se visse confrontada com a necessidade de passar a ter em
consideração as condições de vida dos pacientes e não apenas os efeitos directos
do tumor, do tratamento ou da sua sobrevida. Por conseguinte, o uso de
ferramentas de avaliação da QdV tem evidenciado uma importância preponderante.
Neste estudo propusemo-nos avaliar a percepção da QdV dos pacientes com
tumores cerebrais primários, a influência de factores sócio-demográficos, clínicos,
psicopatológicos e do funcionamento cognitivo, e de que forma estes se
correlacionam. Para tal, foram avaliados 30 pacientes com o diagnóstico de tumor
cerebral primário, de ambos os sexos, do internamento e Consulta Externa do
Serviço de Neurocirurgia da Unidade Local Saúde de Matosinhos - Hospital Pedro
Hispano. Foram administrados o European Organization for Research and
Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire (EORTC QLQ-C30), o Brief
Symptom Inventory (BSI), o Teste do Relógio, Trail Making Test part A and B (TMT
A, B), Teste das Cores e das Palavras de Stroop, Wechsler Memory Scale (WMS) Subprova Memória Lógica, Behavioural Assessment of the Dysexecutive Syndrome
– Subprova Procura da Chave, Wechsler Adult Intelligence Scale – Subprovas
Memória de Dígitos e Código.
Quanto aos resultados obtidos, pudemos verificar que as diferentes variáveis, sejam
elas sócio-demográficas, clínicas, psicopatológicas ou neurocognitivas influenciam
os diferentes índices do QLQ-C30. Observou-se que as mulheres apresentam um
melhor índice de Estado de Saúde Geral/QdV e Funcionamento de Papéis do que
os homens. Verificou-se, também, que os pacientes solteiros apresentaram um pior
Funcionamento Emocional e uma maior severidade do sintoma Diarreia. Os
indivíduos com tumores neuroepiteliais revelaram uma menor severidade no
sintoma Perda de Apetite do que pacientes com outro tipo de histopatologia.
Verificou-se que pacientes com tumores de alto grau de malignidade apresentavam
um índice de Fadiga mais elevado e maiores Dificuldades Financeiras. Ao nível da
psicopatologia verificou-se que todos os itens que compõem o BSI influenciam
diversos índices do QLQ-C30, nomeadamente um aumento desses provocará uma
diminuição ao nível do Funcionamento Físico, Social, Emocional, Cognitivo e do
Funcionamento de Papéis e um agravamento da sintomatologia de Fadiga, Diarreia,
Obstipação, Náuseas/Vómitos, Dificuldades Financeiras, bem como do Estado de
Saúde Geral/QdV. Os dados neurocognitivos obtidos levantam-nos algumas
questões, visto que sugerem que a elevação de algumas funções neurocognitivas
se associa a um pior índice de funcionamento nestes indivíduos, levando-nos a
inferir que as correlações encontradas entre as dimensões do QLQ – C30 e o plano
neurocognitivo não são sustentáveis nem se enquadram em nenhuma perspectiva
teórica, deduzindo apenas que se tratará de uma associação fortuita de variáveis.
A decorrente mudança na abordagem da avaliação destes pacientes, em que se
enfatiza a sua QdV, abordando domínios tais como a saúde física, mental e social,
em detrimento da visão mais tradicionalista em que se privilegiam os factores
biológicos, são motivo de aumento da pertinência deste tipo de investigações.